quarta-feira, 6 de julho de 2016

Como Escrever - Parte 4

<<< LER A PARTE 3
  • Descobrir o que é escrever para você;
  • Ler de tudo um pouco;
  • Exercitar sua escrita em diversos gêneros.
Após ter aproveitado "novos ares", e estar com a visão distanciada daquela que tinha ao trabalhar no projeto original, é uma boa pedida retornar a este e realizar a lapidação, uma das fases mais importantes da escrita.


Imprescindível lembrar que o processo de lapidação não é o mesmo que o de revisão; muitos autores não fazem a revisão de seus próprios textos (falo um pouco sobre isso neste vídeo), o que é uma pena - não que o próprio autor deva fazer a revisão final de suas obras, pelo contrário: o indicado é que outra pessoa o faça; mas revisar a própria escrita é uma tarefa de engrandecimento e aprimoramento para todo escritor, pois é quando se percebem os pontos fracos e se tenta melhorá-los. Ao confundir a lapidação com revisão, muitos pulam essa importante fase do ato de escrever.

O que é, afinal, lapidar um texto? Ora, tal qual se utiliza o termo para com pedras preciosas que vão do estado bruto à forma perfeita, trata-se de polir a escrita, incrementá-la, deixar o conteúdo ainda melhor. Isso pode ser feito de diversas maneiras - apenas para citar algumas:

1) Descrições - editar os trechos descritivos de sua obra, ampliando-os, cortando-os e/ou substituindo adjetivos. Há uma tendência na Língua Portuguesa de não empregarmos adjetivos de forma variada, e acabamos por cair na mesmice quando descrevemos algo. No entanto, ao utilizar palavras diversas, a caracterização de personagens, ambientes e emoções torna-se muito mais rica, e alcançamos níveis visuais peculiares, o que fará nossa obra se destacar para o leitor.

2) Recursos estilísticos - muitas vezes, quando se lê aquilo que foi escrito há um tempo, tem-se sensações completamente diferentes e, com isso, novas ideias. Quer momento melhor para acrescentar detalhes que só deixarão sua história ainda mais prazerosa de ler? Use e abuse de figuras de linguagem - principalmente metáforas e comparações -, pois são elas que tornam o texto mais visual e, consequentemente, mais atraente para o leitor.


3) Omissões e explicitações - um momento bastante importante e que não deve ser delegado à revisão é o de identificar passagens confusas - e aquelas outras que estão demasiadamente explicativas. Nem uma coisa nem outra são boas, independente do gênero - aqueles livros de Matemática em que uma equação enorme é solucionada em duas linhas e você nem entende como se deu a resolução? Ou livros com receitas tão repetitivas no "modo de preparo" que você prefere logo a praticidade de perguntar à sua avó? Por isso, tome cuidado com o que parece claro demais para você, autor, mas que pode ficar mal explicado para o leitor. O mesmo cuidado com a explicação exagerada - nenhum leitor gosta de ser subestimado. Omita o óbvio e explique o necessário.

4) Coesão - tão importante quanto a coerência (a propriedade de fazer sentido) é a coesão, a forma como o texto é costurado. Preste atenção aos pronomes e conjunções - todos os elementos de referência anafórica e catafórica. Eles deixam a escrita amarrada e são responsáveis pela fluidez da leitura, isto é, a facilidade em recuperar as informações escritas através de palavras como "ela", "isso", "lá", "com", "aquele" etc.

Como você deve ter percebido, a lapidação não é o momento de preocupar-se com erros gramaticais. Por outro lado, é a hora perfeita para ser cuidadoso com os demais ingredientes (importantes) que compõem um bom livro. Claro que um editor competente prestará atenção a tudo isso, mas cabe ao autor garantir que o texto chegue às mãos do profissional do livro somente após o processo de escrita ser finalizado - o que só ocorre após a lapidação e, na minha humilde opinião, ao menos uma revisão feita pelo próprio escritor.

Nos vemos na Parte 5!                                                                                                                            

domingo, 15 de maio de 2016

Como Escrever - Parte 3

<<< LER A PARTE 2

Recapitulando o que foi "dito" anteriormente: descubra o que é escrever para você e leia - de tudo um pouco. Óbvio que quando você lê vários tipos de texto, acaba descobrindo seus favoritos, e isso é essencial na hora de escrever. Ao menos inicialmente, o melhor é escrever a respeito do que você entende, e um excelente parâmetro é discorrer sobre o que você gosta de ler. Facilita demais ter essa delimitação, saber o seu território, onde ele começa e termina. 

Não quero dizer, com isso, que é para todo autor encontrar seu nicho e ficar nele. Não. Veja J.K. Rowling, por exemplo: ela foi do incrível sucesso no fantástico para o drama no mundo real e depois para o suspense policial. É saudável para o escritor desafiar-se, cumprindo as etapas necessárias a fim de executar a transição de gêneros de forma eficaz (este provavelmente será assunto de um próximo artigo), mas para quem está começando - e eu me incluo aqui - o mais indicado é permanecer na zona de conforto. 

No entanto, mesmo dentro do seu espaço seguro, é possível criar desafios. Imagine que exercício interessante um autor policial inserir uma personagem cômica em um de seus romances? Ele não saiu completamente de seu "bosque" e, ao mesmo tempo, desafiou-se com uma característica de outro gênero. Aí está uma ideia legal para praticar a versatilidade que os autores prestigiados procuram hoje em dia. Justamente por isso que é de grande valia a leitura de todo e qualquer tipo de texto, pelo conhecimento que proporciona.

 

Outra prática muito proveitosa é a de pegar um de seus livros favoritos, escolher uma cena aleatória e reescrevê-la. Ah, mas vou ficar perdendo tempo escrevendo algo que não é meu? Já li comentários parecidos, muitas vezes, e, ao passo em que consigo entender o sentimento, acho que você deveria dar uma chance. Quantos autores de sucesso não começaram suas obras famosas com fanfics? O próprio fenômeno "Cinquenta Tons de Cinza" teve início como uma fanfic de Crepúsculo! (Não vou entrar no mérito de se a série é bem escrita ou não, até por que vejo muita gente que só a leu em português dando palpite e... bem, digamos que sendo um tradutor (graduado em Tradução & Interpretação), sei bem que o ideal é não julgar o autor através de uma de suas traduções, mas de seu texto em língua original. Assunto para outro artigo.) Além disso, meu próprio livro "O Pentagrama" nasceu através de um desses exercícios. Não uma fanfic ou exatamente uma reescrita, mas uma inspiração. E isso acabou gerando uma série, completamente diferente do livro do qual selecionei o trecho.

Uma última dica valiosíssima para exercitar a criatividade e estimular obras completamente originais: escolha várias personagens e cenários de livros que você gosta e produza um capítulo com "tudo junto e misturado". Invente problemas e situações loucas. É provável que você não resista e vá até o capítulo dois. Talvez até o três. E, se chegar ao quatro, é bastante certo que tem algo válido em mãos, único e digno de uma reformulada nos nomes das personagens e ambientes. Acredite, muitas obras também nasceram assim.

sábado, 13 de fevereiro de 2016

Como Escrever - Parte 2

<<< LER A PARTE 1

Minha querida leitora/blogueira parceira Maisa Evelyn, do site "No Meu Mundo", convidou-me a elaborar um artigo sobre meu amor por livros. Admito que procrastinei por diversos motivos, e não ficarei me desculpando aqui. Sempre há a tendência de vir alguma desculpa esfarrapada (risos), então o que importa é que decidi selecionar esse tema para a segunda parte desse especial.

Não concordo, necessariamente, com a ideia tida como verdade absoluta de que "todo autor é um leitor". Por isso, retomando o que já expliquei na Parte 1, não pretendo assumir uma persona de autor famoso "fodástico" e elaborar um guia cheio de "leis" de sucesso. Pelo contrário, a intenção é compartilhar minha experiência com a escrita para que você me conheça melhor e, caso se identifique e/ou se interesse pelos assuntos abordados, passe a refletir sobre eles e colocar as técnicas em prática.


Já relatei que não obtive sucesso na escrita até conseguir entender o que escrever significava para mim, mas nunca deixei de ser um leitor voraz e observador dos estilos e peculiaridades de meus autores favoritos. Inicialmente, é óbvio que essa análise da escrita alheia era algo bastante inconsciente. O conteúdo era mais atrativo e importante para o Vitor de sete anos; continua sendo, claro, mas há tantas ferramentas que podem incrementar um conteúdo, que seria desperdício não as usar. Justamente por tanto ler, acabei internalizando vários desses estilos e, tão logo comecei a escrever minhas próprias histórias, reproduzi características de meus ídolos: escolhas de sintagmas, estruturação frásica e de períodos, expressões etc.

Dessa forma, posso avançar afirmando que a leitura não é "essencial" apenas para escritores e pessoas que se dizem "leitores viciados" - é uma prática complexa. Obrigatória, na atualidade, porém não compreendida e não realizada por muitos. Ao menos, não da forma que deveria. Afinal, o que é a leitura? Seria apenas a habilidade de decifrar sinais gráficos e saber o que significam as palavras que eles formam?

A leitura vai muito além disso. Ela envolve o conhecimento, pois estimula a reflexão e produção de informação; desenvolve: eleva o indivíduo à categoria de "pensador"; promove análise: aguça os sentidos e lapida a interpretação. E nesse quesito, meu amor é realmente presente de corpo e alma. Como tenho formação em Tradução e Interpretação, o que julgo mais importante é o "saber ler". Não proferir as palavras que os olhos veem ou ouvir as que alguém diz, mas compreender a mensagem. Olhar uma imagem e entendê-la - lê-la. Entender as sutilezas, o porquê do jogo de palavras, da ordem das mesmas, da sonoridade. Captar o dito pelo não dito, o que está nas entrelinhas. 

Meu real fascínio por livros começou aí, a partir do estudo do texto, da língua - e das línguas -, das literaturas. O que eu leio? Sou fascinado por didáticos, paradidáticos, HQs, mangás, revistas, editoriais e colunas de blogs e sites. Tudo para fugir do lugar-comum que é a ficção - gênero no qual me insiro como escritor -, mas também para ilustrar como é importante expandir o campo de leitura. Isso faz com que o leitor tenha contato com diferentes tipologias textuais e entenda como se dá cada gênero de texto com suas particularidades, e como esse conhecimento contribui na hora de expressar-se verbalmente. Sem mencionar o conhecimento de mundo que essas informações agregam.


Preciso fosse eu citar algumas de minhas inspirações e mestres responsáveis por obras fantásticas, seriam: C.S. Lewis - pela simplicidade com que trata assuntos tão profundos, passando pela moral e tocando no Cristianismo, indo de obras de ficção à não-ficção; J.K. Rowling - pela criatividade e genialidade de uma das séries mais ricas de todos os tempos; R.L. Stine - um dos autores em quem mais me espelho. Não apenas é um mestre do gênero suspense/terror, como o escreve para todas as idades, e sua produtividade na escrita é assombrosa; Clarice Lispector - a carga emocional injetada em cada obra é tão gigante que, uma vez iniciado em seus trabalhos, nunca mais fui capaz de ler qualquer coisa da mesma maneira.

Sou assumidamente apaixonado por livros e, apesar das vantagens interativas e até mesmo ecológicas e de armazenamento, não troco o livro impresso pelo digital. Há uma magia na cinestesia de segurar um conjunto de papéis impressos e encadernados, cheirá-los, folheá-los, abrir, fechar. Isso dito, o que importa não é se você lê através de um tablet ou um material impresso. Apenas... leia!

LER A PARTE 3 >>>

quarta-feira, 20 de janeiro de 2016

Como Escrever - Parte 1

Meu nome é Vitor Mendes. Sou autor do romance "O Pentagrama", meu livro de estreia publicado pela Drago Editorial em 2015. Não, não sou nenhum Stephen King, embora escreva suspense e terror também. Não, não vou mentir e afirmar que não tenho pretensão de "ser grande". Se não tivesse, teria deixado meu projeto para sempre numa pastinha esquecida no computador. É só que, diferente do que tenho visto nos últimos tempos, quero me tornar um grande autor à minha maneira. Não quero ser melhor que o rei do momento; apenas quero ser o melhor que eu possa ser, cada vez mais. "Grande" em minha própria definição, e essa por si só me basta.

Assim, com uma pretensão que gosto de considerar saudável para um autor brasileiro e novo no cenário atual, convido você, leitor e/ou autor, a embarcar em algumas reflexões acerca de minhas próprias experiências com a escrita, com o único objetivo de compartilhar meu ponto de vista sobre o que é escrever e - sem querer sugerir, de maneira alguma, que você precise da tutoria de um jovem autor - como realizar tal ofício.


Publicarei uma série de "bate-papos", como gosto de pensar que sejam, nos quais pretendo explorar assuntos já muito "batidos", só que sob minha ótica; ela pode parecer um pouco incomum. Mas eu prometo que, dada sua persistência, fará sentido. É sério.

Clarice define o que é escrever de uma forma curiosa, mas com a qual muito me identifico: "Escrever é procurar entender, é procurar reproduzir o irreproduzível, é sentir até o último fim o sentimento que permaneceria apenas vago e sufocador. Escrever é também abençoar uma vida que não foi abençoada.

Desde a mais tenra idade, eu lia compulsivamente. Colecionava séries aos montes, ao passo em que já tentava reproduzir minhas próprias ideias em livros. Falhei, falhei e falhei. Nunca conseguia ir adiante na escrita. Mais tarde, aos onze anos, teve início um período turbulento de minha pré-adolescência, quando mudei de escola e percebi, chocado, que não me reconhecia naquele novo ambiente. Eu não entendia o lugar, as pessoas. Logo comecei a sofrer bullying no local onde passava a maior parte das horas diárias. Ou melhor, onde passava a maior parte das 8.760 horas de cada ano, por assim dizer. E, com sua permissão, gostaria de explicar que aqui eu uso o termo "sofrer" não como uma invocação da imagem da vítima. Claro que foi assim que me senti, com meus onze anos, ao ser constantemente xingado e segregado por praticamente toda uma unidade escolar, mas certamente não é como enxergo a situação agora. "Sofrer" soa, em meus ouvidos, como o verbo natural de um processo - processo este de enorme importância, pois foi ao longo dele que cresceram sentimentos dos mais variados, vagos e sufocadores, como define Clarice. Mas foi graças a eles que o pequeno Vitor finalmente deixou de falhar e escreveu, porque enfim compreendeu o que é escrever.

Colocar as palavras no papel não dá a sensação de estar meramente fazendo isso. A sensação é tão diversa quanto travar um diálogo consigo mesmo e só ser capaz de fazê-lo enquanto os dedos estiverem escrevendo. Como naqueles debates em que não se pode parar nem por um segundo de argumentar, a caneta deve percorrer o papel - ou os dedos, o teclado -, e a conversa tem que evoluir. Porque somente assim, através dessa conversa barulhenta e silenciosa, que não depende do papel, mas fica registrada nele, é que é possível reproduzir o irreproduzível. 


Se é mesmo possível? Quem sou eu para responder... Se eu consigo? Honestamente, não me importo. O objetivo, desde que comecei a ter sucesso nessa atividade (finalizar uma obra), foi procurar entender. Buscar sentido nos sentimentos e nas situações, sem jamais ter garantia de encontrar alguma coerência. E, de fato, não importa fazer descobertas. O que faz a diferença, no final, é que esse ato traz um alívio e, verdadeiramente, abençoa uma vida que não foi abençoada.

Desse modo, descobri o que escrever representa para mim. Nada mais do que uma forma de lidar com as coisas à minha maneira. É poder me comunicar com alguém mesmo não tendo coragem para isso; é mostrar para mim mesmo como eu queria que um aspecto fosse, e torná-lo exatamente como idealizo. É assumir as rédeas e estar no controle.

Sentir com clareza o que a escrita significa para você é o primeiro passo na jornada sobre "como escrever". E abusando um pouco mais da exuberante Clarice: "Minha liberdade é escrever. A palavra é o meu domínio sobre o mundo."

segunda-feira, 11 de agosto de 2014

Gramática X Efeito estilístico

Uma grande preocupação do autor em relação à escrita é a questão gramatical. Nossa rica Língua Portuguesa, cheia de regras e exceções, não é uma das ferramentas mais fáceis de serem usadas, principalmente por novos autores como eu. O fato de adorar escrever, criar tramas, descrever personagens e considerar-se bom não é o bastante para garantir um texto bem escrito. Falando nisso, o que é um texto bem escrito?

Para os gramáticos, uma boa produção escrita é aquela que leva em conta a aplicação correta das regras gramaticais. No entanto, qual é a real importância disso num trabalho literário? Obviamente, nenhum leitor sente prazer em ler algo cheio de erros de concordância e mal uso de palavras e expressões. Mas onde entram a coerência e a coesão? De que adianta um texto gramaticalmente impecável se este não tem sentido, não apresenta boa conexão de ideias e é "sem sal"? Até que ponto a busca pela escrita gramaticalmente perfeita coloca em risco um texto?


Particularmente, considero minha escrita simples, com vocabulário e construções de frases igualmente simples. Minha prioridade é o conteúdo, e reconheço que acabo deixando a forma um pouco de lado. Claro que busco usar a língua corretamente, mas muito me fascina a quebra de paradigmas. Sou apaixonado pela licença poética e procuro inseri-la em meus textos, aliada a estilos de escrita. Se meu objetivo é produzir um efeito específico em meu texto, por que padronizá-lo de acordo com regras?

Minha professora de Morfossintaxe na faculdade sempre frisa que a desculpa "porque soa melhor" não é justificativa para o uso de determinada estrutura ou regra. Tem de haver um motivo, uma relação sintática. Entendo, mas considero o som de um texto tão importante — se não mais — quanto sua versão escrita. A reprodução sonora oriunda da leitura, mental ou oral, é essencial para a aceitabilidade do leitor. É tão difícil escrever sobre situações cotidianas envolvendo diálogos entre jovens e usar a colocação pronominal! Um "contatá-lo-ei" destrói completamente a verossimilhança. O "me dá aqui" é tão mais fácil de ser lido e processado e permite uma aceitação muito mais natural do que "dê-me aqui". Vale a pena sacrificar a fluidez da próclise por excessivas ênclises, porque é correto?

Não me refiro apenas aos diálogos. A narração é tão "diálogo" quanto as personagens, pois o narrador estabelece um diálogo constante com o leitor. Quão "forçada" não parece uma narrativa formal permeada de diálogos baseados na oralidade? Definitivamente, este "vai-e-vem" entre graus de formalidade não é algo que desejo em meus textos. Um tom permanente compõe uma unidade muito mais coerente, e isso é o que prezo. Não sou contra a gramática, de maneira alguma. Mas também, como ser a favor de algo que limita grande parte dos estilos de escrita? Se eu uso repetição de termos ou sons, é porque quero causar determinado efeito no leitor. Se abro mão de conectores em uma passagem, é porque quero explorar a sensação que diferentes estruturas podem causar; e não necessariamente tornar a escrita “pobre”. Por isso, se aos olhos da gramática meus textos podem não ser bem escritos, fico feliz que, aos olhos da literatura, sigo meu coração e coloco a fidelidade à mensagem e o impacto no leitor em primeiro lugar.

quinta-feira, 31 de julho de 2014

Plot twists

Uma das coisas às quais tenho prestado muita atenção ultimamente é o lance dos plot twists — ou reviravoltas na trama. Basicamente, são aqueles acontecimentos que viram tudo de cabeça para baixo; o querosene no incêndio do circo e o sal na ferida. A importância destes momentos é justamente o sopro de ar fresco que proporcionam à história, quase como uma troca de posições num jogo de vôlei. Quem antes era o "bonzinho" vira o "malvado" e vice-versa; ou ainda, descobrimos um fato sobre o passado de uma personagem que revela uma motivação por trás de suas ações, algo completamente diferente do que esperávamos.

Plot twists são, assim, indispensáveis à manutenção da trama e ajudam também a enriquecê-la. Um livro com muitos acontecimentos é bem mais dinâmico do que outro em que tudo se desenvolve num passo mais lento e previsível. Basta observar as séries de maior sucesso: todas incluem várias reviravoltas.


A surpresa é um elemento essencial aos plot twists, uma vez que, se a reviravolta não surpreende o leitor, acaba não sendo realmente uma reviravolta, mas apenas um fato que — na melhor das hipóteses — já fora previsto e estava sendo aguardando ansiosamente para que acontecesse. Neste caso, uma das saídas é jogar o twist sobre a reação das personagens. Como tal personagem reagirá à descoberta de determinada informação? Reações também podem adicionar muito ao crescimento da história, e quando se consegue aliar a surpresa do ocorrido àquela da reação de uma personagem, temos o perfeito plot twist.

Escrever "O Valete Negro" tem sido uma experiência mais divertida do que "O Pentagrama", uma vez que as personagens já tiveram seus perfis e suas histórias básicas apresentadas no decorrer de um livro inteiro. Agora eu sinto mais liberdade para brincar com as mesmas e explorar seu passado, seus sentimentos e seus pensamentos. É aí que os plot twists entram em cena. Sendo personagens já conhecidas do leitor, as reviravoltas revelam-se extremamente úteis em mostrar outro lado de cada um deles, algo inesperado. É mais fácil criar os twists com perfis pré-apresentados, mas é preciso também cuidado para que os mesmos se encaixem com o fundo da trama e o resultado fique equilibrado.

No fim das contas, é uma ferramenta muito, mas muito divertida.